terça-feira, 29 de março de 2011

Memória Rubro-Verde: O inesquecível Armando Nogueira sobre o eterno Dener

Sei que grande parte da torcida da Portuguesa não gosta muito do jornalista Juca Kfouri. Reconheço que há muitos motivos para isso, principalmente pela maioria de suas opiniões sobre a Lusa serem quase todas negativas e pejorativas. No entanto, nesta terça-feira (29), Juca Kfouri postou em seu blog uma homenagem a Armando Nogueira, um dos maiores jornalistas e cronistas esportivos que esse país já viu, que falecia há um ano exatamente. Para homenageá-lo, Juca Kfouri postou um texto de Nogueira sobre Dener, na ocasião da morte do "Reizinho do Canindé".

Não pude deixar de reproduzir aqui o post de Juca Kfouri que, além de homenagear um dos maiores ídolos do Canindé, também homenageia um dos maiores cronistas esportivos que o Brasil já teve, se é que um dia terá outro igual. O cartoon abaixo foi feito por Fellipe Elias da Silva, colaborador do blog do Juca Kfouri. Confira abaixo o texto de Armando Nogueira:

Post retirado do Blog do Juca Kfouri:

Um ano sem o mestre...17 anos sem Dener

A morte silencia os pés de Dener.

Pés polêmicos. Angelicais.

Não o conheci pessoalmente. Conheço-o, apenas, de colossais cintilações com a bola. Vi-lhe, porém, mil vezes, o rosto na televisão. Tinha olhos de desenho animado. Redondinhos. Duas bolinhas de meia. Levemente, tristes. Olhar de drible. Dissimulado de quem pressentia um golpe traiçoeiro da vida. Morreu dormindo. Só assim mesmo: desperto, teria driblado o destino.

Desde Garrincha, ninguém driblou neste mundo com a graça e a audácia de Dener. Oferecia a bola, sonso e doce manjar. O rival, de bote armado. Infausta missão. Dener saía, fogoso, fagueiro, a versejar com a bola, sua musa. Ela, só dele. Se não era poeta, Dener jogava um futebol poético. Seus dribles hão de pulsar sempre no meu peito que, agora, se consome de tristeza.

É mais uma alegria que se vai do futebol. Como tantas que se foram noutros pés, agora, relembrados, com infinda saudade. Pés poéticos, que reiventaram a árida geometria do futebol. Quando o via a driblar e fintar meio mundo, eu me perguntava, morto de inveja: de que servem meus pés, se Deus não me ensinou a driblar como Dener?

Consola-me imaginar que o anjo que levou Dener deste mundo é o mesmo que alçou os pés de Garrincha, no vôo derradeiro.

Consola-me saber que, enfim, Dener está liberto de chuteiras, de escudos, de críticas, de palmas, de bandeiras. Consola-me, Dener, saber que driblarás, agora, sem tensão, no silêncio do teu céu. Como Canhoteiro, jogarás de pés descalços. Como Garrincha, peito nu. Intangíveis feito a tarde musical dos campos em delírio.

Três anjos do futebol celestial.

Confesso que tu partes, Dener, sem me ter feito um grande favor. Sempre esperei de ti que, um dia, ainda haverias de driblar, de uma vez, os dois times de um mesmo jogo: o teu e o dos outros; e que haverias de entrar, magnífico, com bola e tudo, nos dois gols, ao mesmo tempo. Porque tua bola, anjo Dener, sempre rolou acima do bem e do mal. Nem derrota, nem vitória. Só devaneio. Tua bola nunca foi a bola dos homens, que é meio de vida. Tua bola sempre foi e será a bola dos meninos, que é fantasia, apenas.

Teus troféus, que eu saiba, foram todos esculpidos no tempo e no vento. Na pureza da grama que florescia de teus dribles. Flor de tantas relvas por teus pés pisadas.

E porque me lembras outro menino, na efêmera eternidade de um drible, despeço-me de ti, com a mesma prece com que me despedi de Garrincha:

Onde quer que estejas, cuida bem de ti, porque, um dia, hás de voltar à brisa dos campos como a lua que volta ao pátio dos poetas.

Link: http://blogdojuca.uol.com.br/2011/03/um-ano-sem-o-mestre/

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